terça-feira, 30 de junho de 2009

Recomeçar

Foi ontem anunciada a saída do director do 24horas, Pedro Tadeu, que deixará o jornal no final do mês de Julho, depois de quase oito anos à frente deste diário. Desde Julho de 2007 que sou adjunto do Pedro na direcção do 24 e esta notícia mexeu, naturalmente, comigo. Porque não a esperava. Porque não conhecia os motivos exactos que levaram a este desfecho. Porque para mim o Pedro era o director e ponto final.

É quando as pessoas se vão embora que costumam vir os discursos do "ah, era tão boa pessoa" e tal. O Pedro sabe o que penso dele, por isso posso poupar-me a isso. Como toda a gente que o conhece sabe bem como ele é - não tem nada que enganar.

São nobres e muito raras as motivações que o levaram a sair do jornal. É muito difícil encontrar uma pessoa que tenha o discernimento para perceber que uma coisa está emperrada por sua culpa. Isso não é inteiramente verdade, mas, ao reconhecer isso, o director do jornal pôs em primeiro lugar os interesses da publicação, do projecto, dos leitores, e só depois os seus. Não me lembro de alguma vez ter conhecido alguém que o tivesse feito - e já trabalhei com muita gente que insistia em agarrar-se a cargos de chefia para os quais não estava, manifestamente, talhada.

O 24horas vai renascer com uma nova direcção, um novo rumo, uma nova estratégia. É o partir pedra desde o zero, é o repensar tudo, é o pôr tudo em causa.

E as coisas vão correr bem.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

O Repórter X

Sempre tive um pavor por notícias falsas. E ao mesmo tempo um fascínio, uma curiosidade em saber o que leva os jornalistas a inventarem histórias. Por outro lado também acho um exercício interessante perceber em que momento da construção da notícia o repórter é enganado ou sai do trilho da verdade, sem se aperceber disso.
Hoje há muitos jornalistas que inventam. A possibilidade de não citarem fontes ("falei com um gajo da PJ, que me contou isto, e isto, e isto, mas claro que não o posso citar" - onde é que já ouvimos isto?) levou a que muitos jornalistas partissem para notícias escrevendo apenas convicções pessoais, sustentadas em fontes falsas.

Mas o rei da mentira, da falsidade, e que até acabou por se tornar cómico, chamava-se Reinaldo Ferreira e ficou conhecido por "Repórter X". Num trabalho académico com o tema "Notícias Falsas na Imprensa Diária" ofereci-lhe um capítulo. E ele merece-o.

Nascido a 10 de Agosto de 1897, em Lisboa, desde muito cedo mostrou gosto pela escrita e pelos jornais. Devorava folhetins policiais, vibrava com os assuntos quentes que apaixonavam multidões. Talvez por isso, virou-se para o jornalismo.
Reinaldo entrou na redacção de “A Capital” com apenas 16 anos. De imediato deu nas vistas pela sua criatividade e pela forma acutilante e apaixonada de relatar os acontecimentos. Três anos depois era colaborador de “O Século”. E foi aqui que começou a desenvolver o que, mais tarde, viria a ser conhecido por “Reinaldices”, sinónimo de aldrabices.

A primeira aventura em que se meteu foi quando resolveu relatar a história arrepiante de um crime ocorrido na Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa. “O Século” foi dando as notícias, que envolviam bandidos encapuzados, um cadáver e um misterioso malfeitor a quem Reinaldo chamava “O homem dos olhos tortos”. Os textos eram sempre assinados por Gil Goes, pseudónimo escolhido por Reinaldo Ferreira.

Esta história começou a ganhar proporções tais que “O Século” teve de revelar que, afinal, tudo o que se estava a contar era ficção pura. “O Mistério da Rua Saraiva de Carvalho" deu mesmo num livro, que foi, inclusive, adaptado ao cinema com o título de “O homem dos Olhos Tortos”.
Este caso acabou por dar enorme projecção ao jovem Reinaldo. Meses depois, em Março de 1918, escreveu uma reportagem para “A Manhã” relatando a vida de mendigo. Para isso, tirou uma foto vestido de indigente a pedir esmola. No final, apresentou o relato completo, com as contas aos 47 centavos que tinha conseguido juntar e todas as peripécias vividas no tempo em que andou a fazer-se passar por pobre. A verdade é que tudo foi inventado. A única coisa verdadeira era mesmo a fotografia.

Reinaldo Ferreira foi aprimorando a técnica de ficcionista. E em nova reportagem para “O Século”, ainda em 1918, fabrica um assassinato de um suposta turista numa pensão de Lisboa. O repórter chega a destruir o quarto da pensão e espalha sangue de galinha por todo o lado, para obter um relato mais impressionante de uma história completamente falsa.

A veia de ficcionista também lhe dava para outras coisas. No dia da morte de Sidónio Pais, a 14 de Dezembro de 1918, Reinaldo Ferreira inventou o que disse serem as últimas palavras do estadista revolucionário: “Morro eu, mas salva-se a Pátria”. O que se sabe é que o jornalista não estava na estação do Rossio, onde Sidónio Pais foi morto, nem, sequer, alguma vez trocou uma palavra com ele.

Desafios pessoais e profissionais, levam Reinaldo Ferreira a viajar para Paris, primeiro, e Barcelona, depois. E é da Catalunha que resolve escrever um artigo para ser publicado em Portugal atacando o ditador Primo de Rivera, que a 13 de Setembro de 1923 resolve fazer um golpe de Estado em Espanha e tomar o poder, com a conivência do Rei Afonso XIII. Só que o jornalista teve medo de poder vir a sofrer represálias por causa desse artigo, por isso resolveu assinar a peça apenas como “Repórter”. Quando o texto chegou às mãos do tipógrafo, este olhou para a assinatura e leu “Repórter”. Mas em frente a esta palavra estava um pequeno rabisco que se assemelhava a um X. Pensando fazer parte do nome, o tipógrafo assina o artigo como “Repórter X”, nome que viria a ficar para a história.

Antes de morrer – o que aconteceu aos 38 anos –, Reinaldo Ferreira continuou a fazer das suas. Pelo jornal “ABC” inventou toda a cobertura jornalística dos meses que se seguiram à morte de Lenine na Rússia – o jornalista nunca chegou a sair de Paris e escreveu dezenas de reportagens relatando episódios caricatos vividos em Moscovo, onde frequentemente se cruzava com portugueses.

Pelo “Primeiro de Janeiro”, Reinaldo fez o País acreditar que existia uma campanha alemã que iria produzir libras em loiça, para desacreditar a moeda inglesa. Mas aqui as coisas acabaram por correr mal ao Repórter X. Nesta história, envolveu o nome do banqueiro português Francisco Borges, do banco Borges&Irmão, e a mentira descobriu-se. Reinaldo Ferreira foi despedido do jornal. Tentou a sua sorte criando pequenas publicações próprias, mas não teve grande sorte. Reinaldo enfrentava aqui o momento mais duro da vida.Dependente de morfina, foi obrigado a fazer uma cura de desintoxicação. Nunca conseguiu largar completamente o vício. O Repórter X acabou por morrer a 4 de Outubro de 1935, em Lisboa. Ficou na história como um dos mais brilhantes jornalistas da sua época. A época em que para se ser bom jornalista não era essencial respeitar sempre a verdade.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

My bad Lucky

Quando o carro arrancou eu sabia que nunca mais os voltaria a ver – e anos mais tarde, quando voltei lá, também tinha a certeza de que eles já lá não estavam. E não estavam.

Naquele dia, enquanto o meu pai levava o Citroën BX castanho, tipo banheira, por travessas e avenidas de uma Lisboa que para mim, miúdo, era um mundo, eu lançava olhares para as placas com os nomes das ruas, como Hansel atirava pedaços de pão para o chão – eu queria voltar, eu tinha de voltar àquele sítio, ao sítio onde estava uma parte de mim.

Eram uns 40 e andavam comigo para todo o lado. “O Bandido Maneta”, “Os Dalton Regeneram-se”, “Daily Star”, “Os Rivais de Painful Gulch”, “A Diligência”, “Jesse James”, se não os tinha a todos, tinha-os quase a todos. Até tinha uma mala própria para os transportar, uma mala cinzenta, quadrada, com duas rodinhas (só uma é que rolava, a outra tinha defeito) e uma asa para a puxar, porque os meus bracitos de 11 anos não aguentavam tanto peso.

Por aquela idade a minha vida andava à volta dos jogos do Spectrum 48k e dos livros do Lucky Lucke. O computador já estava habituado a ficar em casa, até porque para funcionar obrigava à presença de gravador, televisão, cassetes, enfim, uma logística que o tornava intransportável. Já os livros não. Esses tinham a tal malinha cinzenta, quadrada, com a rodinha defeituosa, e cabiam todos lá dentro, apertadinhos.

Com os irmãos longe, Jolly Jumper, Rantamplan e os Dalton eram meus companheiros de todas as noites. Era neles que pensava, era com eles que sonhava, eram as suas aventuras que me faziam feliz. Em frente ao espelho também eu sacava de uma arma, em tempos em que nem sabia o que era o Taxi Driver. Só queria ver se conseguia ser mais rápido do que a minha sombra. Não era. Nunca era. Por isso continuava a tentar, porque achava que um dia, se tentasse muito, muito, muito, conseguiria.

De cada vez que mudava de cidade, lá ia a minha roupa na mala vermelha, a minha vida na mala cinzenta. Mais do que saber se o meu novo quarto era grande, queria saber se naquele sítio novo havia livrarias. E se nessas livrarias existiria algum livro que me faltava na colecção. Uma nova descoberta implicava ir à lata amarela de Nesquik onde se amontoavam moedas dos trocos dos jornais que comprava para o meu pai e as notas que os tios e os avós ofereciam nos dias que me visitavam. Só saíam de lá para as mãos do senhor livreiro, que, em troca, me oferecia corações aos saltos em forma de livro animado.

Numa semana era capaz de o ler 20 vezes - três vezes ao dia. Cada livro novo tinha em mim o efeito do encaixe da última peça num puzzle. A minha vida era esse puzzle, que se completava com pouco, com o tal livro novo.

Um dia, naquele dia, que foi mais um dia em que mudei de cidade, perdi-os para sempre. Uma visita a Lisboa, uns dias num hotel não muito caro numa esquina perto do Marquês de Pombal, terminaram com uma fuga, uma fuga para a frente, uma fuga sem retorno, uma fuga que eu nunca percebi e jamais esqueci. A bagageira do Citroën BX, a banheira, que chegara com as minhas duas malas, a vermelha e a cinzenta, partia agora apenas com uma, com a que não me fazia falta, com a que eu queria que tivesse ficado para trás.

O meu pai fugia para não ter de pagar a conta. Paguei-a eu. E não foi com dinheiro.

Quase 20 anos depois apanhei as migalhas de pão que deixara no chão naquele dia, segui as pistas da memória, os nomes das ruas, das travessas de uma Lisboa que então já dominava, e encontrei o hotel onde ficara a mala da rodinha torta com os meus livros.
Na recepção contei à senhora a história dos livros, da mala, da fuga, do meu amor pelo cowboy solitário e pelo seu fiel cavalo. Contei-lhe tudo com um sorriso que não o era. Ela devolveu-mo. E eu sabia que era tudo o que ela me podia dar.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Dúvida

As pessoas que chamam xalxixa à salsicha são as mesmas que dizem Manxexter em vez de Manchester, não são?

Tu precisas tanto de amor e de sossego, eu preciso de uma folga

Café. Preciso de um café. Vou buscar a chávena de plástico (1,19 euros, pacote de 10, no Continente), a colher descartável e entro na casa de banho.

Foda-se! Como é que eu vim parar à casa de banho? O que é que eu estou aqui a fazer? Tenho de descansar.
Saio da casa de banho e vou-me sentar. Foda-se! Café. Preciso de um café. Levanto-me. E agora? Onde é que eu ia mesmo?

É nestes momentos que tenho a certeza de que não faz bem à saúde ir no 17.º dia consecutivo de trabalho.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

O meu 11 de sonho

Arrastava eu um malão barato pelo aeroporto de Charles de Gaulle quando a marcha imperial do Star Wars se fez ouvir. Procurei o telemóvel em todos os bolsos - estava no último, claro, está sempre. Era de "A Bola", jornal onde trabalhava na altura.

- Tou, Ricardo?! Já chegaste a Paris?
- Acabei de chegar. O Bruno Santos está aqui à minha espera. Porquê?
- Está bem... E então, não tens nada para contar?
- Não... Porquê? O que é que se passa?
- Não leste o "Record" de hoje?
- Não. Acabei de chegar a Paris, e não o comprei no aeroporto. Porquê? Traz alguma história do Zé Azevedo que eu não dei?
- Não... então vê se lês. E começa pelo editorial do Alexandre Pais. E não te esqueças de mim quando fores para o "Record".

Em Julho de 2003 fui enviado-especial de "A Bola" à edição centenária da Volta a França em bicicleta. Foi naquele mês que passei em França que percebi que Paris é mesmo a cidade do amor, porque foi lá que me apaixonei por ciclismo.
Naquele dia, no dia em que aterrei, o director do jornal rival do meu escrevera um editorial em que se armava em treinador de jornalistas e fazia o "11" dos melhores jornalistas com quem já tinha trabalhado. E lá no meio deles estava eu, jornalista de "A Bola".
Perdi a conta aos telefonemas que recebi nesse dia. Não havia uma pessoa que acreditasse que não, que eu não tinha sido convidado para o "Record", que não, que o Alexandre Pais não me tinha ligado para me aliciar a juntar-me ao inimigo, que não, que não voltara a falar com o Alexandre mais de duas ou três vezes desde que eu tinha saído do "24horas", no ano 2000, onde nos conhecemos e trabalhámos juntos.
Os telefonemas divertiram-me. O reconhecimento orgulhou-me.

Hoje vou fazer o mesmo. Vou armar-me em treinador de jornalistas e escolher o 11 ideal de craques da escrita com que já trabalhei. Uns são meus amigos, outros nem por isso, e há mesmo gente de quem não gosto, mas a todos reconheço méritos invulgares. A ideia não é meter só vedetas, mas, sobretudo, fazer uma equipa equilibrada de gente que sabe pensar, escrever, pesquisar e furar.

1. Bernardo Ribeiro ("Record")
É o guarda-redes perfeito - e não é só por ser... largo, vá. É sólido, dá confiança a quem trabalha com ele, sabe comandar equipas, refila quando tem de refilar. Trabalhámos juntos no "24horas" e em "A Bola". Dificilmente nos reencontraremos profissionalmente, porque eu não quero voltar ao desporto e ele não quer sair de lá.

2. João Cristóvão Baptista ("24horas")
É o Dani Alves do jornalismo. Puto, mas com uma invulgar maturidade. Numa equipa de gente mais velha, mais experiente, não lhe caberia o papel de desequilibrador, mas é o que faz todos os dias. Rápido, certinho, inteligente. Está lá tudo.
Continuamos a ser colegas, e espero tê-lo à mão por muitos anos.

3. Manuel Catarino ("Correio da Manhã")
É o central perfeito, um Baresi, um Maldini. Forte, astuto, experiente, raposa velha. Não deixa escapar nada, sabe de tudo um pouco e ninguém lhe passa a perna. Domina a sua área como poucos e sabe dar os gritos certos na hora certa. É uma besta quando tem de ser, e às vezes é preciso sê-lo.
Fomos colegas no "24horas" nos meus dois primeiros anos de carreira.

4. Hugo Vasconcelos ("A Bola")
É um Pepe que não bate nas pessoas. Sólido, sabe sempre encontrar a solução equilibrada para os problemas. Joga simples quando tem de jogar, mas sabe ir lá à frente marcar golos, mesmo que não seja essa a sua função. Sabe ser central, trinco, defesa-direito ou ponta-de-lança. É o jogador que qualquer um quer ter na equipa.

5. Nuno Perestrelo ("A Bola")
É o Roberto Carlos nos seus bons tempos. Ai querem que seja defesa-esquerdo? Tudo bem, eu sou. Mas eu gosto é de ir lá à frente marcar livres. E vai. E marca. É o homem a quem se pede uma coisa e ele consegue sempre isso e um extrazinho. Depois ainda transcende as suas funções e quando damos por ele já fintou meia equipa adversária e está isolado em frente ao guarda-redes. É o homem que gosta de ter o balneário com ele e dá-se tão bem com o treinador como com o puto acabado de chegar dos júniores.
Fomos companheiros no "24horas" e na "Focus". É das pessoas que mais falta me fazem na redacção.

6. Pedro Jorge Castro ("Sábado")
É o Xavi, o carregador de pianos, o líder, o patrão da equipa. É o homem que quando não está, a equipa vai ao fundo. Sabe pensar, sabe comandar, sabe agir na hora certa. Não pára um minuto e dá tudo dentro de campo, seja contra o Real Madrid seja contra o Mataró. É raro o talento de um trinco ser reconhecido. Xavi foi eleito o melhor jogador da Europa em 2008. O Pedro Castro foi eleito por mim como o melhor jornalista com que já trabalhei.
Fomos colegas no "Portugal Diário" e no "24horas". Pronto, e também fomos colegas de casa durante um ano.

7. Ana Sofia Fonseca (free-lancer)
Tem o talento de Cristiano Ronaldo, mas arma-se em Dominguez. Sabe tudo sobre fintas, adora adornos, gestos técnicos, maldades aos adversários. É uma alegria vê-la dar toques nas palavras, pará-las em cima da cabeça, atrás da nuca, no joelho. Uma artista. Marcasse golos e seria uma estrela.
Trabalhámos juntos no "24horas".

8. Rui Hortelão ("Diário de Notícias")
É um Deco. Sabe construir jogo, sabe vir atrás defender, recupera bolas, sabe levar a equipa para a frente, sabe driblar e ainda marca golos. É o homem que gosta de ter a bola nos pés e mesmo que não a tenha ela vai lá parar, porque há sempre alguém que lha passa à espera que ele faça algo de bom.
Trabalhámos juntos no "24horas" e na "Focus"

9. Miguel Pinheiro ("Sábado")
É o Ibrahimovic. Bola nos pés é golo pela certa. Sabe pensar, esperar e actua no momento certo. Um fora-de-série.
Trabalhámos juntos no "24horas".

10. Nuno Miguel Maia ("Jornal de Notícias")
É o Messi do jornalismo português. Sabe tudo sobre bola. Tem a garra de um puto, a experiência de um senior, um talento ímpar. Não tem defeitos. É claramente o jogador que faz a diferença, que marca os golos decisivos, que arquitecta as jogadas mais fantásticas. Quase nunca falha. E ainda consegue ser importante no balneário.
Fomos colegas em "A Bola" e no "24horas".

11. Ferreira Fernandes ("Diário de Notícias")
Zizou. É o Zidane. Pezinhos daqueles há poucos. Cabecinhas assim também. Adora pensar o jogo e pôr a equipa a mexer. Brilha quando tem de brilhar e aparece sempre a desequilibrar nos momentos-chave e nos grandes jogos.
Trabalhámos juntos na "Focus".

Suplentes de luxo: Luís Fontes ("24horas"), Emídio Fernando ("TSF"), Rui Gustavo ("Expresso"), Alda Rocha ("Focus"), Paulo Caetano (deixou o jornalismo), António Magalhães ("Record"), Miguel Cardoso Pereira ("A Bola"), Ana Maia ("24horas"), Gerardo Santos ("24horas"), Pedro Emanuel Santos (desemprego), Raquel Lito ("Sábado"), Ana Carreteiro ("24horas"), Catarina Guerreiro ("Diário de Notícias"), Lina Santos ("24horas"), Luís Silvestre ("Sábado"), Marco Alves ("24horas"), Francisco J. Marques (perdi-lhe o rasto) e Sávio Fernandes ("24horas").

E estes admiro-os da bancada: João Miguel Tavares ("Time Out" e "DN"), António Costa ("Diário Económico"), Nuno Vinha (Lusa), Ângela Marques ("Diário Económico"), Micael Pereira (free-lancer), Miguel Alexandre Ganhão ("Correio da Manhã"), Ana Garcia Martins ("Time Out"), Ricardo Santos (free-lancer), Eduardo Dâmaso ("Correio da Manhã") e Rodrigo Guedes de Carvalho ("SIC").

Tenho a certeza de que me esqueci de muitos. Desculpem lá qualquer coisinha.

domingo, 26 de abril de 2009

O 24

Era champanhe por todo o lado, gargalhadas, o director com um boné que não se-lhe enterrava por completo na cabeça, e lhe dava o ar de totó que não tinha, o chefe de redacção que mal não se aguentava de pé, uma multidão de gente que nunca tinha visto foi naquela noite ao oitavo andar do prédio do Marquês de Pombal. Celebrava-se o fecho do número 1 do 24horas. Foi no dia 4 de Maio de 1998.

Lá no meio andava eu, a mascote do pasquim, puto de 21 anitos, cara de bebé, fascinado com aquilo tudo, com a gente grande em atitudes criançolas, a informalidade dos chefes que até costumavam usar gravata e falar torto.

No dia seguinte de manhã ia para Paris, como enviado-especial. O avião era daí a umas horas, mas por nada eu queria perder aquilo. Sentia que algo estava a acontecer, a nascer, e eu queria estar ali, para uns anos mais tarde poder recordar o momento, falar sobre ele, como agora.

Ontem vivi o renascimento do 24horas. Passaram-se quase 11 anos desde aquela noite de copos no oitavo andar do prédio aqui mesmo ao lado. Já não sou o puto, nem a mascote, sou o chefe que não é formal nem usa gravata e raramente fala torto.
Ontem não houve bebedeiras, nem muitos sorrisos, nem bonés meio enfiados na cabeça de directores, houve sim stresse, pressão e gritos para que se cumprisse religiosamente a inatingível hora de fecho, as 18h30. Conseguímos.
Agora vamos todos à gráfica buscar a criança e olhá-la nos olhos pela primeira vez. Mesmo que dali venha a coisa mais abjecta à face da terra, para nós, os pais, será sempre linda, a mais linda.

O 24horas que hoje chega às bancas é o resultado do esforço de muita gente de qualidade, esforçada, que se empenhou e sacrificou por um produto que acreditamos ser inovador e que poderá, por isso, resistir num mercado cada vez mais difícil.

Agora, venham as críticas, venham os ataques, venham os rótulos. Uma coisa é certa: segunda e terça vamos "vender" mais do que todos os outros diários juntos. :)

E que daqui a 10 anos possa estar a contar tudo sobre mais um renascimento do 24horas. Sinal que o título vingou, que resistiu, que existe.

A cidade que ficou sem beijos


Basta dizer que os olhos do mundo estão no México, onde a gripe suína ameaça virar pandemia mundial.

A imagem diz o resto.
O El Mundo juntou-lhe um título redundante, mas bonito.
"A cidade do México ficou sem beijos e sem sorrisos".

sábado, 25 de abril de 2009

Sair à rua

É a ovelha mais ovelha de todas, aquela que grita frases de ordem. O senhor do megafone, o líder do rebanho, é, também, uma delas, uma ovelha, mas é uma ovelha perversa, uma ovelha manietada pelo pastor para assegurar a ordem dos passos, da marcha lenta e ordenada.

Já gostei, mas já não gosto de desfiles e manifestações. Acho o princípio da coisa bastante válido, acho as demonstrações de força formas ainda úteis de alertar para que algo vai mal. Mas isso é a excepção. Contam-se pelos dedos de uma mão as verdadeiras mobilizações de pessoas descontentes que, nos últimos anos, mexeram de facto com a sociedade, que abanaram as estruturas.

Por isso, hoje, as manifs são quase sempre desfiles tristes de gente triste, sem ideias, que precisa das tais ovelhas perversas, as de megafone na mão, para seguirem um caminho. Não me chega a ideia de que há gente que precisa de quem fale por elas. Não me chega a ideia de que é necessário um sindicato para defender o interesse dos trabalhadores. Não me chega a ideia de que houve um Abril que nos deu Liberdade e, agora, isto é uma luta a dois, entre Capitalistas e Proletariado. Não chega dizer que Abril não morreu. É preciso que cada um viva Abril dentro de si. Como disse JFK, não devemos perguntar o que é que Abril faz por nós, mas o que é que nós devemos fazer por Abril.

Conquistamos a nossa liberdade com determinação, mérito, espírito de sacrifício, talento, e não com gritos de ordem patéticos e desfiles que deviam continuar a existir apenas para que as datas não morram, e não como tentativas de prolongar uma luta contra um inimigo que já não existe, ou que existe, mas está travestido, e, por isso, tem de ser combatido de outra forma.

25 de Abril sempre,
Fascismo nunca mais!

Sim, como é óbvio.

A luta continua,
Abril está na rua!

Por amor de Deus!

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Carré de Eleven com azeitonas

Só não me ri porque não era fino, parecia mal, porque não queria, naquele momento, que me confundissem com aquilo que eu sou, um gajo do povo, pouco habituado a coisas assim.

Foi a minha primeira vez no Eleven, o que se diz ser "O restaurante", mas que não é, é apenas um restaurante a armar ao fino, onde há coisas boas, há coisas agradáveis, há empregados de restaurante fino, educados, conhecedores, prontos para servir gente que não eu, gajo do povo, que acha que um tacho com uma batata frita e um raminho de um qualquer legume é coisa que dá para rir. Para eles é coisa séria. Como para eles, comida, é coisa pouca com nomes indecoráveis. Para mim comida é coisa farta com nomes como "borrego assado no forno" e não "Carré de cordeiro em crosta de azeitonas do Alentejo com gratinado de batatas".

Gostei de ir ao Eleven porque foi a primeira vez, porque foi a oportunidade de saber do que se fala quando se diz "fui ao Eleven". E foi só por isso.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Morreu o Che em mim

Foram as guerrilhas de Che nas matas de Cuba e na selva do Congo em busca de liberdade, foi a fuga impossível que Cunhal idealizou e concretizou da cadeia de Peniche para escapar à persecutória PIDE, foram as guerras encetadas pelo povo do Chile contra o regime sangrento e opressor de Pinochet, foram todas estas batalhas, aventuras de gente pobre e oprimida contra gente rica e poderosa, que me levaram um dia a pensar que sou uma pessoa de esquerda.

Sempre preferi Davides a Golias. Sempre torci por aquela equipa da terceira divisão que joga para a Taça com um clube rico. Sempre gostei de observar as pessoas simples, muito mais do que conviver com a nata da sociedade. E sempre vivi com as histórias dos Guevaras e dos Cunhais na cabeça.

Um dia acordei e percebi que já não sou de esquerda. Continuo apaixonado pelas lutas dos fracos contra os fortes (e sempre do lado dos fracos), mas isso não faz de mim uma pessoa de esquerda. Ou melhor, tenho coração à esquerda, mas a razão virada para outro lado.

Só os insensíveis podem passar uma juventude ser ser do PC. Mas que jovem no seu perfeito juízo não se deixa levar pelas desventuras dos heróis portugueses que enfrentaram Salazar e devolveram a liberdade a Portugal? Não percebo, não concebo, que se possa ser de direita aos 18 anos. Da mesma foram que me faz espécie ver homens feitos, pais, avôs, de braço esticado a gritar "Assim se vê a força do PC".

Crescer é também deixar de viver as histórias da juventude. É racionalizar em vez de sonhar. É bom sonhar, mas não podemos levar uma vida de sonho num mundo real. E o mundo real não está para histórias de heróis guerrilheiros. A luta, hoje, é outra, e não vai lá com Guevaras. Vai lá com a força de cada um. E se cada um não tiver dentro de si a determinação de um Che, não espere que ele venha das matas para nos salvar.

Desencantaram-me as histórias de guerrilhas. Desencantaram-me as pessoas que mas contavam e levavam uma vida contrária a tudo o que diziam defender e a tudo em que diziam acreditar. Morreu em mim o miúdo encantado com lutas que chegou a levar bastonadas na escadaria do Parlamento, morreu em mim o rapaz que fundou o Comité Revolucionário de Estudantes Marxistas numa universidade de direita, morreu em mim o "comuna", como me apelidavam os colegas de balneário na equipa de futebol.

Um dia, se tudo isto mudar, se voltarmos aos Salazares e Pinochets, lá estarei, nas catacumbas, a planear lutas pela liberdade, com boina à Che, pronto a dar a vida por um futuro melhor. Até lá, não deixará de me bater o coração à esquerda, mas com a razão virada para outro lado, concentradas noutras lutas.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Penoso

Foi quando um pedaço de hamburguer - ou batata, ou uma miscelânia das duas - me caiu da boca, e quando a miúda que estava à minha frente soltou um risinho que me fez corar, que a pergunta me veio outra vez à cabeça:

"Mas quem é que me disse que é boa ideia tentar almoçar quando se tem metade da boca anestesiada pela senhora dentista?"

segunda-feira, 13 de abril de 2009

O sr. Lavoisier não quer fazer aí umas breves?

Durante anos não quis acreditar e lutei contra essa ideia instalada como um puto salta para tentar recuperar a bola das mãos de um adulto cruel que não lha devolve. Também eu era puto, inocente, e achava que sabia mais do que os outros.

No jornalismo, como na química, manda o princípio da conservação da matéria, ou seja, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.

O "Correio da Manhã" faz hoje capa com uma história que tem três anos. A mesma história, exactamente os mesmos protagonistas, e até uma formulação de capa idêntica apareceram na primeira página do extinto "Tal&Qual" em Agosto de 2006. Mas a verdade é esta: já ninguém se lembra. E como ninguém se lembra, volta a ser notícia. Nada se criou, nada se perdeu e bastou transformar um bocadinho a coisa para que ela estivesse novamente pronta a usar.

O mesmo "Correio da Manhã" fez capa há uma semana com uma história que tinha saído no "24horas" quatro dias antes. O "24horas" de amanhã, por sua vez, trará na capa um assunto já tratado pela "Sábado" da passada quinta-feira. Os leitores não são os mesmos, é verdade, mas a recauchutagem é uma coisa que chateia, embrutece, empobrece o espírito.

No século XVIII, Antoine Lavoisier, o primeiro químico a sério, constatou que "na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma".

No século XIX, Auguste Comte pegou na frase de Lavoisier e adaptou-a à Sociologia, dizendo que "na natureza, como na sociedade, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma".

No século XXI, Ricardo Martins Pereira pegou na frase de Comte e adaptou-a ao jornalismo, dizendo que "na natureza, como na sociedade, como no jornalismo, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma".

E é pena que tenha de ser assim.

Mas vou continuar a saltitar para ver se arranco a bola das mãos do adulto.

domingo, 12 de abril de 2009

RIP Quique

Diz-se ser injusto quando um treinador é despedido por uma bola que embate no poste, por um avançado que falha um penálti, por um defesa que é expulso após uma agressão estúpida. O jogo perde-se, o mister vai para a rua.

O Benfica atira bolas às barras, falha penáltis, tem jogadores estupidamente expulsos, mas a norma não é essa, e o que o Benfica mais faz não é isso, é, sim, não jogar a ponta de um corno.

É então que se pode dizer em consciência que é justo um treinador ser despedido.

Adeus, Quique, que saudades não deixarás.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

O meu Edward Bloom



Descobri há uns anos que sou filho do Edward Bloom, e que não existem apenas Edward Blooms nos mundos fantasiosos e criativos de Tim Burton. Há Edward Blooms lá, no cinema, nas backstories dos grandes argumentistas, que se esforçam por inventar personagens fascinantes, como há Edward Blooms cá, a viver as suas vidas de faz-de-conta, a contar as suas histórias mirabolantes a quem gosta de se deixar levar.

Cresci a ouvir, encantado, as histórias do meu Edward Bloom. Como naquela noite tão escura, tão escura, tão escura em que ele me revelou, pela primeira vez, a sua verdadeira identidade. Afinal, o meu pai era o Homem-Aranha, o meu herói da banda desenhada. Estava ali comigo, naquele quarto, na Praia das Maçãs, mas logo que eu adormecesse teria de subir pela teia até à sétima nuvem, a verdadeira casa do senhor mascarado de vermelho e azul.

Quando percebi que, afinal, não havia Pai Natal, o Homem-Aranha não podia ser o meu pai e o meu herói já era o Bento, guarda-redes do Benfica, fui encantado por outra história, a da noite em que ele, o meu pai, pisou o relvado do Estádio da Luz, equipado à Académica de Coimbra, acabado de saltar do banco de suplentes para marcar um penálti ao Costa Pereira, o lendário número 1, campeão da Europa e titular da Selecção Nacional. O meu pai fez o golo, mas a Académica perdeu por 4-1.

E depois vieram as histórias da guerra do Ultramar, das namoradas que podiam ser miss mundo, dos feitos no jornalismo, das amizades tu-cá-tu-lá com gente que enchia revistas e abria telejornais. E eu sempre lá, a ouvir, já sem encanto, já sem crença, mas com a certeza de que, ao deixá-lo contar, ao deixar o Edward Bloom ser apenas ele, o Edward Bloom, estava a fazê-lo feliz, a oferecer-lhe o brilho de que ele precisava como de ar para respirar.

Tal como o outro Edward Bloom, o do Tim Burton, também o meu viveu aventuras ao lado de gigantes e anões, mulheres com dois torsos e bruxas mágicas, poetas e assaltantes de bancos. Eram todos eles que abrilhantavam as histórias, davam-lhes grandeza, profundidade, validade, traziam sorrisos a quem as ouvia e inveja a quem não as tinha vivido. Era para mim que invariavelmente se viravam os olhares dos que, no fim, me diziam: “Quem me dera ter um pai assim, com tantas histórias incríveis”. Eu devolvia o sorriso, já que era só o que podia fazer.

As histórias do velho Bloom, o do cinema, tinham tanto de bonito como de inocente. Eram fantasias que serviam para dar cor a vidas cinzentas, davam essência a dias que, de outra forma, não teriam o porquê de ser recordados. Como a história que Bloom criou para contar ao filho sobre o dia em que ele nasceu. Disse-lhe que nesse dia capturou um peixe gigantesco – o Big Fish – que lhe havia comido a aliança, e que ele o obrigou a cuspi-la, já que ele não lhe admitia que lhe roubasse o símbolo do amor que tinha pela mãe do rapaz. Mais tarde, à beira da morte, o filho ouviu do médico que assistiu ao seu nascimento, que o pai nem sequer lá estava, e que não houve peixe algum, e que o parto correu bem, que foi normal, e que nada de especial ou diferente aconteceu. E o miúdo sorriu, e preferiu continuar a pensar que no dia em que nasceu, afinal, houve peixe, e aliança, e uma história para animar plateias em dias de festa.

Muitas histórias do meu Bloom eram assim, inocentes, como a do Homem-Aranha ou a do golo no Estádio da Luz. Mas muitas outras tinham pouco de risível, e muito de coisa séria. E enquanto a ouvi-las estava apenas eu, o eterno ouvinte, o ouvinte inocente e que se limitava a sorrir com ternura a ouvir aquelas fantasias mascaradas de verdade, não havia problema. Só que as histórias, fantasiadas, e sobre coisas sérias, foram sendo contadas umas e outras vezes a toda a gente, a gente nada habituada a ouvi-las, gente que se encantava de facto por não as perceber como fantasias, mas como verdades. Só que essas fantasias duravam pouco e, quando reveladas, criavam desencanto, raiva, inimigos, guerras, ódios. E o meu Bloom não parou de as contar. E foi contando e contando e contando, e as pessoas foram desaparecendo. Os gigantes, os anões, as bruxas e os assaltantes de banco continuaram a ser histórias na boca do meu Bloom, mas, num estalar de dedos, a plateia deixou de estar lá.

As cadeiras estão vazias. A tenda há muito que foi desmontada. E, sozinho, o Bloom continua a pregar.

No dia em que morreu, o Bloom do cinema teve lá os seus gigantes, anões, bruxas, poetas e assaltantes de bancos.

No dia em que morrer o meu Bloom não terá lá ninguém. E nem as histórias, as fantasias, ficarão para contar. Porque já não encantam, apenas envergonham.