terça-feira, 21 de abril de 2009

Morreu o Che em mim

Foram as guerrilhas de Che nas matas de Cuba e na selva do Congo em busca de liberdade, foi a fuga impossível que Cunhal idealizou e concretizou da cadeia de Peniche para escapar à persecutória PIDE, foram as guerras encetadas pelo povo do Chile contra o regime sangrento e opressor de Pinochet, foram todas estas batalhas, aventuras de gente pobre e oprimida contra gente rica e poderosa, que me levaram um dia a pensar que sou uma pessoa de esquerda.

Sempre preferi Davides a Golias. Sempre torci por aquela equipa da terceira divisão que joga para a Taça com um clube rico. Sempre gostei de observar as pessoas simples, muito mais do que conviver com a nata da sociedade. E sempre vivi com as histórias dos Guevaras e dos Cunhais na cabeça.

Um dia acordei e percebi que já não sou de esquerda. Continuo apaixonado pelas lutas dos fracos contra os fortes (e sempre do lado dos fracos), mas isso não faz de mim uma pessoa de esquerda. Ou melhor, tenho coração à esquerda, mas a razão virada para outro lado.

Só os insensíveis podem passar uma juventude ser ser do PC. Mas que jovem no seu perfeito juízo não se deixa levar pelas desventuras dos heróis portugueses que enfrentaram Salazar e devolveram a liberdade a Portugal? Não percebo, não concebo, que se possa ser de direita aos 18 anos. Da mesma foram que me faz espécie ver homens feitos, pais, avôs, de braço esticado a gritar "Assim se vê a força do PC".

Crescer é também deixar de viver as histórias da juventude. É racionalizar em vez de sonhar. É bom sonhar, mas não podemos levar uma vida de sonho num mundo real. E o mundo real não está para histórias de heróis guerrilheiros. A luta, hoje, é outra, e não vai lá com Guevaras. Vai lá com a força de cada um. E se cada um não tiver dentro de si a determinação de um Che, não espere que ele venha das matas para nos salvar.

Desencantaram-me as histórias de guerrilhas. Desencantaram-me as pessoas que mas contavam e levavam uma vida contrária a tudo o que diziam defender e a tudo em que diziam acreditar. Morreu em mim o miúdo encantado com lutas que chegou a levar bastonadas na escadaria do Parlamento, morreu em mim o rapaz que fundou o Comité Revolucionário de Estudantes Marxistas numa universidade de direita, morreu em mim o "comuna", como me apelidavam os colegas de balneário na equipa de futebol.

Um dia, se tudo isto mudar, se voltarmos aos Salazares e Pinochets, lá estarei, nas catacumbas, a planear lutas pela liberdade, com boina à Che, pronto a dar a vida por um futuro melhor. Até lá, não deixará de me bater o coração à esquerda, mas com a razão virada para outro lado, concentradas noutras lutas.

1 comentário:

  1. eu já não tenho 18 anos (tenho mais 4), mas quando os tinha já me considerava de direita... (mas não sou facista, não sou salazarista... )
    acho que no mundo utopico viveriamos segundo os principios do comunismo e sem duvida que acho que são no ideal fantasticos... vivermos todos contentes e satisfeitos tendo o suficiente para viver em paz e harmonia... mas só de escrever isto apercebo-me que só viveriamos num mundo assim se retirarmos algumas das mais viscerais caracteristicas humanas (ganancia, inveja, preconceito...) é uma construção fantasiosa e quase infantil, concordo totalmente contigo quando dizes que o comunismo e ideais de esquerda acabam por se perder com a inocência
    não sei porquê sempre tive esta noção e por isso nunca me consegui identificar com pessoas ou partidos de esquerda, e desde que tenho alguma consciencia politica e social me considerei mais adpeta de ideias de direita por achar que são os mais "implementaveis"

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